Foto: poracaso.com |
Zé fez o mesmo ritual de todas as noites. Bateu o papelão contra a
parede para tirar a poeira, como se isso fosse deixá-lo menos sujo.
Sacudiu um surrado pedaço de pano, que lhe servia de lençol desde
que foi morar na rua, quando a mulher o expulsou por causa da bebida. Hora
de deitar em sua cama de papel.
Mas, não naquela noite. Nem em
tantas outras depois daquela. Zé ficou quieto e esperou. Nenhum som
além do ronco das motos que corriam pela avenida mal iluminada,
atravessando o sinal vermelho enquanto ninguém notava. Zé sentiu
falta de outro ronco: o de João, seu companheiro de rua, tão
ninguém quanto ele.
A
caixa de papelão de João estava encostada no canto do muro. Uma
bela cama de 32 polegadas. E nada de João.
– Ele tinha ido tomar uma – Zé
conta.
Mas
não voltou. Jamais voltaria.
Zé
foi atrás do amigo. Saiu com os pés descalços pela pista e avistou
um cachorro. O vira-lata empurrava alguma coisa com o focinho e
latia. Zé foi ver o que era. Um corpo. Ninguém tinha notado ainda.
Só o cachorro. E agora, Zé.
João
estava ali deitado. Largado como as frutas podres no fim da feira. O
sangue escorria pelo chão e manchava os pés de Zé. Um corte
profundo no pescoço, de orelha a orelha, dava a impressão de que
João estava rindo. Enquanto isso, seu companheiro chorava.
Zé
perdia ali um amigo da rua, colega de quarto da beira do asfalto.
Mais que isso. Perdia o ronco marcante de João, que no fundo lhe
fazia bem. A insônia de Zé virou saudade. E
agora, Zé?
Gostei do texto Ygo. Fechamos os olhos para uma triste realidade que nos assombra nos faróis da vida dia após dia, não é mesmo? Só nos resta pedir a Deus que abençoe e conforte esses tristes moradores de ruas, que apelaram pro asfalto devido a drogas, bebidas e outros problemas que assolam a nossa sociedade. Abraço!
ResponderExcluirwww.newsnessa.com
Olá, Vanessa.
ExcluirFico feliz que tenha gostado do texto e que ele tenha te provocado essa reflexão. Concordo com o que você disse.
Abraço!
Oi Ygo!
ResponderExcluirQue texto maravilhoso!!! Quantas vezes vemos essas pessoas na rua, mas a ignoramos? Você me fez pensar nisso, nas histórias que essas pessoas tem e no que estão enfrentando agora.
Continue escrevendo!
Beijos,
Sora - Meu Jardim de Livros
Oi, Sora.
ExcluirÉ isso mesmo. Até lembrei de uma música da Pitty, que diz: "Eu estava aqui o tempo todo, só você não viu".
Que bom que você curtiu e refletiu. Obrigado!
Volte sempre!
Beijos.
Valeu Ygo!!! Nossa triste realidade você retratoú muito bem, muitas e muitas vezes estas pessoas são vistas como: " Não pessoas" infelismente estão em todas as partes em nossas cidade. Ainda não somos capazes resolver está triste situação. " Pensamos em lustres mas em nossa volta há muita escuridão, sejamos pelo menos uma simples luz de uma vela, precisamos ter olhos de se vê, ação para pelo menos minimizar esta grande dor! Ygo forte abraço!
ResponderExcluirOlá, Aguiar.
ExcluirVocê captou bem a mensagem.
Bom vê-lo por aqui de novo. Forte abraço!²